Jason Lutes. Berlim

Berlim - Editora VenetaHallo, meine Freunde!

Acho que seria adequado começar dizendo por que li Berlim, de Jason Lutes.

Primeiro porque é uma HQ muito famosa, recomendada e etc. Segundo porque a parte gráfica é realmente impressionante.

Berlim ocupa o 48º lugar na lista de 50 melhores HQs sem super-heróis da revista Rolling Stone.

A edição, que no Brasil sai pela editora Veneta, é lindérrima. Gente, sério, a capa dura é linda demais, o papel é de uma gramatura que valoriza o desenho e é bastante agradável ao toque, apesar de dar aparência de que a HQ é ainda maior que as suas 591 páginas. Não se assustem, foi uma escolha muito acertada da editora. Por exemplo, minha edição de A Montanha Mágica, de Thomas Mann, tem 841 páginas e é mais fina que Berlim.

É sobre a História do cotidiano berlinense no final da República de Weimar até a ascensão de Adolf Hitler ao poder.

História está pau a pau com a minha paixão por leituras de ficção, então… ficção histórica em quadrinhos com essa qualidade e proposta é um prato cheio e suculento para minha pessoa.

E por fim, aquele peteleco que deu o impulso final para essa leitura é que eu tive a oportunidade de ir passear em Berlim, aí escolhi uma leitura para entrar no clima da viagem e virar uma berlinense temporária.

Posso garantir que a leitura transformou minha viagem em uma experiência bem mais rica e imersiva.

Lá no Instagram tem um post sobre as coisas mais ligadas a livros e uma fotinha do prédio da Berliner Philarmoniker. Clica aqui para ver.

O turismo histórico foi mais intenso do que está postado no Insta. Muito sensacional! A História da capital alemã é riquíssima apesar de os prédios serem modernos (ou restaurados, quando possível) por causa da destruição da Segunda Guerra Mundial.

It's Going to Be 600 Pages Long": An Interview with Jason Lutes - The Comics JournalJason Lutes, o quadrinhista, não é alemão. É estadunidense. Ele nasceu em 1967 em Nova Jersey, ou seja, teve que fazer uma pesquisa e tanto para compor esses quadrinhos.

Digo “esses quadrinhos” no plural, porque Berlim foi publicada aos poucos, em vinte e dois episódios entre os anos de 1996 e 2018. O início das publicações foi 63 anos depois do último fato narrado na trama, que foi a posse de Hitler como Chanceler (isso não é spoiler, é História, fato amplamente conhecido mundialmente. Obrigada pela compreensão!).

A HQ traz flashbacks que iniciam em 1918, mas a história principal começa em 1928, quando a personagem ficcional Marthe Müller, uma jovem de família rica, se muda da cidade de Colônia para Berlim para estudar artes. Marthe tem talento para desenhar e vai pisar na capital pela primeira vez. No trem, ela conhece Kurt Severing, um jornalista berlinense, cético, crítico e um pouco pessimista, que acaba se tornando amigo dela, depois namorado e tals.

File:Berlin Brandenburger Tor Abend.jpg - Wikimedia Commons

Portão de Brandeburgo – Berlim

As tramas subjacentes são muito boas, tão boas quanto a do casalzinho principal. São esses outros núcleos de personagens que dão tridimensionalidade para a história. Entre eles teremos, um casal que se separa por divergências ideológicas, ele segue rumo ao nazismo e ela ao socialismo. Teremos outros personagens nesses dois campos políticos e é por meio deles que o leitor acompanha o caldo dos embates e como se desenvolveram para tornar a segunda guerra e os horrores do pensamento fascista possíveis. Ainda no campo ideológico temos os Social-democratas*, que eram os mais afeitos à República de Weimar.

Uma pausa para explicar Weimar em pouquíssimas palavras: é o período do entre guerras. Após a primeira GM a Alemanha deixa de ser império e, portanto, monarquia, passando ao regime parlamentarista. Esse período, marcado por crises econômicas e políticas, termina com a chegada do Partido Nacional-Socialista, que de socialista não tinha nada e ficou mais conhecido como Partido Nazista, o que vai culminar na segunda GM. Ou seja, o período social-democrata durou de 1919 a 1933, sendo de 1928 a 1933 à trancos e barrancos.

Além desses núcleos já mencionados Berlim traz também uma família rica judia, mendigos, uma banda de Jazz estadunidense que se apresentava em Berlim, as festas dos ricos vida loca, os homossexuais, bastidores da imprensa… Tudo isso junto com inovações tecnológicas, crise de 1929, debandadas de berlinenses em fuga. Enlouquecedor. Algumas coisas lembram o Brasil de 2013 a 2022.

Não sei hoje como seria a classificação indicativa dessa obra. Talvez 16 anos. Dependendo de como for, poderia ser recomendada em escolas de ensino médio para entender como era o cotidiano da Alemanha naquele tempo que antecedeu e propiciou o surgimento de uma ideologia tão deletéria como o fascismo.

Coincidentemente, ontem de manhã um amigo me apresentou uma música, que combina demais com o assunto desse texto: Deutschland, da banda Rammstein.

Eu sei, eu sei… Rammstein é muito famoso, como assim eu não conhecia? Já fui melhor em novidades musicais, foi mal aí. Metal não é lá meu tipo de rock favorito. Estou ouvindo as músicas (e lendo algumas traduções) desde ontem.

Pelo que pesquisei é uma banda polêmica quanto a orientação político-ideológica e tanto a história dela quanto a letra dessa música específica dariam um texto a parte.

O clipe é muito impressionante em termos de cinematografia. Palmas para a fotografia, direção de arte, roteiro.

durante a googlada pela banda Rammstein, esbarrei com uma informação que nada tem a ver com o tema da música ou da HQ, mas é grave e importante registrar. Esse ano, no mês de maio, o vocalista do Rammstein, Till Lindemann, foi acusado de dopar e abusar de fãs em festas oferecidas pela banda. A polícia alemã iniciou as investigações em junho.

Deixo também um vídeo da versão brasileira do jornal Deutsche Welle contando e tentando ajudar a entender as polêmicas da banda e outro do canal Alemanizando explicando a letra de Deutschland, beleza?

Alemanizando foi muito consultado por mim quando estava me preparando para a viagem. Eles falam também sobre cultura e cotidiano alemão e também dão dicas de viagem por outros lugares apesar de o foco mesmo ser a Alemanha.

Auf Widersehen!

 

*Thomas Mann, escritor alemão e autor do livro grosso que usei para comparar o tamanho das edições, era um dos entusiastas e militantes da social-democracia.

LUTES, Jason. Berlim. Tradução: BOIDE, Alexandre. São Paulo: Veneta, 2020.