
Capa do livro O velho e o mar de Ernest Hemingway.
‘Sentiu depois pena do grande peixe, que nada tinha de comer, e a sua determinação em matá-lo não contrariava a pena que sentia. “A quantas pessoas dará de comer?, pensou. Mas são elas dignas de o comer? Não, claro que não. Não há ninguém digno de o comer tal é o seu comportamento, a sua grande dignidade”.’
HEMINGWAY, Ernest. O velho e o mar
Um velho, um rapaz e um peixe são os personagens de O velho e o Mar, de Ernest Hemingway. É uma história de solidão, aventura e redenção. Trama para ter como trilha sonora as músicas de Dorival Caymmi.
O rapaz, Manolin, tinha muito carinho pelo velho, Santiago. Costumavam sair para pescar juntos e o velho lhe ensinava os segredos do ofício. Eram pescadores e fãs de Beisebol, especialmente do jogador Joe DiMaggio.
Santiago passava por uma fase de pouca produtividade nas incursões ao mar, não fazia uma boa pescaria há muito tempo. Por isso, o pai de Manolin o mandou acompanhar outros pescadores mais sortudos. O rapaz obedeceu ao pai, porém continuou conversando com o amigo e o incentivando a não desistir.
Eis que um dia, o velho sai com seu barco para o alto mar. A aventura inicia quando ele pesca um peixe gigante, um marlim. A caçada durou dias, nesses dias o velho sentiu fome, se queimou com o sol forte, dormiu ao relento, cortou a mão, perdeu equipamentos, lutou contra tubarões e se afeiçoou ao peixe. É genial como Hemingway vai contando a história e construindo delicadamente a relação entre o velho e o peixe.

Hemingway e um marlim em Havana/Cuba, em julho de 1934. Fonte: John F. Kennedy Presidential Library and Museum)
A história se passa em Cuba, país do coração de Hemingway, que tem vários pontos turísticos relacionados ao escritor estadunidense.
O velho e o mar foi enviado à editora acompanhado de um bilhete em que estava escrito “Eu sei que isso é o melhor que posso escrever na minha vida toda”. Hemingway estava com a reputação em baixa, era considerado um escritor acabado devido a um hiato de 10 anos entre a publicação de Por quem os sinos dobram (1940) e Do Outro Lado do Rio e Entre as Árvores (1950), esse segundo livro foi mal avaliado pela crítica. O Velho e o mar (1952) foi responsável pelo retorno triunfal do escritor. Conquistou um Pulitzer (1953) e impressionou a comissão que julga o Nobel de literatura, que, por sua vez, agraciou Hemingway em 1954.
Outros personagens ficcionais, de outras obras, também passaram por situações insólitas em alto mar.

Cartaz do filme As Aventuras de Pi, de Ang Lee. Título original: Life of Pi.
As aventuras de Pi, filme de Ang Lee, baseado no livro homônimo, escrito por Yann Martel, arrebatou 4 estatuetas no Oscar, sendo elas por: melhor direção, trilha sonora original, fotografia e efeitos visuais. Um garoto indiano sobrevive ao naufrágio de um navio onde estavam os animais do zoológico de sua família rumo à América do Norte. Pi, escapa em um bote salva vidas com um tigre, chamado Richard Parker, uma hiena, uma orangotango e uma zebra. Até que restam somente ele e o tigre de bengala, que seguem juntos até o final da aventura. Pi narra duas versões para o que aconteceu com ele após o naufrágio, deixando uma dúvida sobre qual delas é a verdadeira. Há a versão com os animais e outra em que os animais são substituídos por humanos: o cozinheiro (hiena), marinheiro japonês (zebra), a mãe de Pi (orangotango fêmea) e Pi (tigre de bengala).
As Aventuras de Pi, o livro, deu a Yann Martel o prêmio Booker (2002).
Existe uma acusação de plágio contra Yann Martel. Ele teria copiado a história de Max e os felinos (1981), do escritor brasileiro Moacyr Scliar. Essa obra foi traduzida em três línguas além do português e recebeu boas críticas nacionais e internacionais.
Martel admitiu, inicialmente de um jeito mal educado, ter usado como premissa as ideias de Scliar. Em edições de As aventuras de Pi, publicadas depois do escândalo do possível plágio, Yann Martel incluiu nos agradecimentos o autor brasileiro: “já a centelha de vida, devo ao senhor Moacyr Scliar”.

Capa de Max os Felinos de Moacyr Scliar.
Em Max e os Felinos, o personagem alemão Max, embarca em um navio, fugindo do nazismo. No navio, estavam sendo transportados animais para um zoológico no Brasil. O navio naufraga e ele fica com um jaguar em um escaler. Consegue sobreviver quando o escaler chega em uma praia no estado brasileiro do Rio Grande do Sul. Depois de ser socorrido e se recuperar, prossegue sua vida em solo brasileiro.

Capa do livro O Auto da Compadecida de Ariano Suassuna.
É fundamental mencionar uma das mentiras contadas pelo personagem Chicó de Auto da Compadecida, peça de Ariano Suassuna, que se aproxima muito de O Velho e o Mar. Chicó disse, que quando foi ao Amazonas, foi pescado por um pirarucu, pois se enrolou na corda do arpão e quando acertou no bicho foi arrastado pelo peixe por três dias e três noites. Por sorte, o pirarucu teria morrido na entrada de uma vila, de onde uma lavadeira viu o aceno de Chicó e chamou outras pessoas para soltá-lo. Auto da Compadecida, também foi transformado em filme e, embora peça e filme não sejam exatamente iguais, são ambos de ótima qualidade.
Chicó falou pouco do pirarucu, não dando detalhes de sua convivência com o bicho, até porque essa é apenas uma passagem da peça, que tem como assunto principal o julgamento dos personagens. Já o marlim, o tigre e o Jaguar despertaram nos personagens humanos sentimentos como afeição, respeito, medo. Eles lhes fizeram companhia. No caso do velho, o peixe foi caça, que se revelou muito mais astuto do que o esperado, chegando a ser considerado um adversário digno de respeito, à altura do pescador, e um objetivo para que Santiago tivesse uma razão para viver. Os felinos foram parar nos barcos com os rapazes por força das circunstancias e querer mantê-los vivos e ainda se proteger foi também causa a que, tanto Max quanto Pi, creditam a sobrevivência aos naufrágios.

João Grilo (Matheus Nachtergaele) e Chicó (Selton Mello) em O Auto da Compadecida, de Guel Arraes.
Talvez o velho Santiago seja um reflexo de Hemingway na época em que o criou, por se recusar ao fracasso e lutar até provar aos outros do que era capaz.
Sobre estas histórias fantásticas de convivência entre humanos e animais, tomo por minhas as palavras do sábio Chicó: “não sei, só sei que foi assim” (Suassuna).
HEMINGWAY, Ernest. O velho e o mar. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.
SUASSUNA, Ariano. Auto da Compadecida. 40ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2018.
Martel, Yann. As Aventuras de Pi. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012.
SCLIAR, Moacyr. Max e os Felinos. Porto Alegre: L&PM, 1981.
LEE, Ang. As aventuras de Pi. EUA, 20th Century Fox, 2011.
ARRAES, Guel. O auto da compadecida. São Paulo: Globo Filmes, 2000.
Os Videos foram acessados em 31/01/2021
02/02/2021 at 21:48
Bacana!
Me lembrou meu pai e meus tios com suas histórias de pescador… os velhos e o rio! Rs!
03/02/2021 at 07:22
Isso é parte do plano, suscitar memórias! Obrigada!=)
03/02/2021 at 10:13
Za, amo essas amarrações, vc é genial.
03/02/2021 at 14:11
Obrigadaaaaaa! =)
03/02/2021 at 15:17
Agora vou ser obrigada a ler Max e os felinos, para comparar com as Aventuras de Pi. Genial a forma em que você fez a conexão entre as obras.
04/02/2021 at 08:06
Haahahahaha você não se arrependerá! Beijos!
17/02/2021 at 08:04
Perfeita conexão! Que surpreendente você se revelou como analista critica de obras literárias. Estou gratamente surpresa. E como vc desperta na gente a curiosidade. Gratidao. Bjos
17/02/2021 at 09:59
Opa! Estou muito feliz que tenha gostado!
Obrigada pelas belas palavras!
Beijos!